Pedagogia viva: cultivando o afeto e a escuta em todas as etapas da educação
É o profissional que se mostra disponível para escutar, acolher e compreender os sentimentos das crianças, garantindo um ambiente de aprendizagem seguro, acolhedor e propício ao desenvolvimento integral
À medida que as crianças avançam na escolaridade, essa postura afetiva, investigativa e sensível vai sendo substituída por uma lógica mais dura. - Foto: Pixabay
Tenho acompanhado com atenção e com esperança as transformações que a pedagogia vem vivendo nas últimas décadas. Fico animada ao ver como o papel do pedagogo se ampliou e se fortaleceu. Não somos mais apenas os responsáveis por repassar conteúdos; somos mediadores de experiências, cuidadores do desenvolvimento integral e defensores de uma educação mais humana, crítica e inclusiva. A Base Nacional Comum Curricular (BNCC), nesse sentido, tem sido uma grande aliada. Ela consolidou uma visão de educação que valoriza o protagonismo dos estudantes, o trabalho por projetos, o respeito às múltiplas linguagens e à diversidade.
Nesse caminho, o pedagogo deixa de ser figura técnica e se torna presença sensível, política e transformadora. Na Educação Infantil, essas diretrizes costumam florescer com intensidade: vejo salas repletas de cor, experiências sensoriais, rodas de conversa, investigações curiosas e vínculos reais entre adultos e crianças. Vejo educadores comprometidos, atentos aos detalhes, registrando com observação atenta e escuta sensível. É aí que tudo parece fazer sentido. O pedagogo se mostra disponível para escutar, acolher e compreender os sentimentos das crianças, ele contribui para que elas se sintam seguras para aprender, expressar dúvidas, correr riscos e superar desafios. Ele garante um ambiente de aprendizagem seguro, acolhedor e propício ao desenvolvimento integral das crianças.
Mas, com o tempo, algo se perde, e é sobre essa perda que preciso falar. É comum ver que, à medida que as crianças avançam na escolaridade, essa postura afetiva, investigativa e sensível vai sendo substituída por uma lógica mais dura, conteudista e distante. Aos poucos, o lúdico vira “infantil”, o diálogo vira “perda de tempo” e os sentimentos passam a ser vistos como “interrupções” no processo de aprendizagem. E, sem que percebamos, vamos reconstruindo um modelo autoritário, frio e sem escuta...justamente aquilo que dizemos ter superado!
É necessário manter viva, ao longo de toda a escolaridade, a escuta, o brincar, a criação e o afeto. Como pedagoga, eu defendo a pedagogia viva, mesmo diante das cobranças, metas e burocracias. A educação não pode ser um afago apenas no começo. Ela precisa ser inteira, contínua e coerente. O que a criança aprende nos primeiros anos sobre vínculo, respeito e escuta deve ser fortalecido, não descartado. Não podemos permitir que a infância seja a única etapa da vida escolar em que o afeto é valorizado. É urgente manter viva essa chama em todos os níveis de ensino.
Porque, no fim, é disso que se trata educar: não de formar apenas bons alunos, mas de formar seres humanos inteiros, que saibam pensar, sentir, cuidar e transformar o mundo ao seu redor.
Artigo de Maria Sangilma de Jesus Aires Franco: especialista em Psicopedagogia e professora na Educação Infantil no Colégio Marista Águas Claras
COMENTÁRIOS